“Nessa era da economia da atenção, o novo motor econômico é o cérebro.” É a partir desse princípio que Fabiana Nascimento idealizou o World Neuroscience & Tech Ecosystem (WNE), única instituição brasileira vinculada ao sistema de neurotecnologia do país. Atualmente, o hub conecta o Brasil com outras 32 nações para debater soluções que integram o cérebro e a tecnologia, além de fomentar pesquisas, parcerias e negócios.
Levar a neurotecnologia a diferentes setores se tornou a missão de Fabiana desde o seu primeiro contato com a área. Formada em banco de dados, a CEO do WNE relata que sempre teve uma afinidade com o tema. No entanto, foi somente ao começar a atuar com BI (Business Intelligence) que decidiu se aprofundar no assunto, buscando uma especialização em neurociência. “Quando a gente olha para um dado, ou estamos querendo influenciar ou compreender um comportamento, e eu queria entender de onde vêm esses comportamentos”, relata.
Foi nesse momento que a executiva conheceu a neurotecnologia – e também percebeu o quanto o setor carecia de profissionais da área tecnológica. Hoje, o campo possui mais pesquisadores ligados à saúde do que à informática, engenharia ou computação. “Parece que, quando a gente fala ‘neuro’, o pessoal esquece o que vem depois na frase.”
Defensora da ‘Internet dos Humanos’ – convergência entre a experiência humana e a tecnologia – e da tecnologia neuromórfica, Fabiana passou a mostrar aos pares a importância de se conectar com essa nova área para que os equipamentos do futuro sejam efetivamente desenvolvidos. “É uma área de grandes conexões, tanto com a inteligência artificial quanto com a robótica, infraestrutura, conectividade e, principalmente, com o desenvolvimento”, afirmou.
Para ela, o investimento vai além da inovação das máquinas: trata-se do avanço do ser humano, algo ainda mais necessário em tempos de inteligência artificial (IA), nos quais vivemos hiperconectados e com dificuldade de concentração. Como exemplo de como a tecnologia pode auxiliar nesses casos, a executiva cita dispositivos vestíveis que contribuem para o foco e a produtividade de colaboradores, além de práticas voltadas à saúde mental, como a meditação.
“A gente sabe que a inteligência artificial é uma onda que veio para ficar, mas, enquanto não entendermos que quem interage com ela somos nós – e que precisamos saber como isso funciona para nós –, não vamos extrair todo o potencial que ela poderia ter”, afirma.
Outra lacuna identificada por ela foi a ausência de protagonismo nacional no tema. Quanto mais a CEO pesquisava e participava de congressos, mais percebia que as empresas que investiam em neurotecnologia, embora com sedes no Brasil, não eram brasileiras. Para promover essa conexão, decidiu unir a neurotecnologia à uma paixão nacional: o futebol.
A proposta era aplicar os conhecimentos e dispositivos da neurociência para potencializar o desempenho dos atletas, que precisam alcançar alta performance de forma ágil. Para isso, Fabiana entrou em contato com clubes e a ensinou técnicos a utilizar as novas ferramentas.
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O projeto foi ganhando notoriedade em um momento em que a FIFA (Federação Internacional de Futebol) divulgou uma recomendação para que as confederações passassem a considerar a neurociência. “Eles entenderam que o novo jogo é mental.”
A convergência desses dois movimentos resultou em um convite para que Fabiana se tornasse professora na CBF (Confederação Brasileira de Futebol) e, posteriormente, colaborasse com o Comitê Olímpico Brasileiro. Hoje, já são mais de 2,3 mil treinadores formados e certificados em neurotecnologia pela profissional. “Os atletas precisam estar bem preparados mentalmente. E a gente sabe que isso leva tempo, então, quando queremos escalar, vamos trazer uma área intermediária, que é a tecnologia.”
A iniciativa teve sucesso ao impulsionar a neurotecnologia no país, mas, diz ela, ainda há um caminho longo a frente. Com os líderes empresariais cada vez mais sobrecarregados, a CEO percebe que o apetite por inovação diminuiu e que muitas organizações têm esperado o hype das ferramentas passar para, só então, investir nelas.
No caso do Brasil, defende, esse atraso pode representar inclusive uma ameaça à soberania nacional. Ela lembra que países como os Estados Unidos já utilizam drones controlados pela mente desde o governo do ex-presidente Barack Obama, por exemplo. Além disso, o mapeamento cerebral e o uso de dispositivos desenvolvidos por essa ciência levantam questões ainda mais delicadas sobre a privacidade de dados.
“Estamos falando de um dado que tangencia a minha privacidade mental. Não é mais o meu CPF, mas sim o fato de eu preferir azul ou vermelho – e que, se eu colocar o meu e-commerce mais azul ou vermelho, o consumidor vai comprar mais.”
Para avançar nessas outras frentes, Nascimento idealizou e criou o World Neurotechnologies Forum (WNF), evento que reúne diversos atores do setor para debater os próximos passos da neurotecnologia de forma ética, responsável e humanizada, além de ampliar a visibilidade desse campo de inovação.
A última edição contou com 3.882 participantes, mas a deste ano, que acontece no próximo dia 26 de agosto, espera reunir um público de 10 mil pessoas. “Sabemos que é um grande desafio, mas nos aliamos a alguns parceiros, ao governo brasileiro, e estamos construindo esse ecossistema que une pesquisa científica, soluções e colaborações para que as empresas possam se apropriar desse conhecimento sobre a mente.”
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